Narrador esportivo Kaio César fala sobre pedido de demissão durante o Globo Esporte, alegou perseguição do diretor Paulo César Norões do SVM
Ele aponta 'perseguição' de diretor da empresa como motivo para o ocorrido. Na manhã
deste domingo, 17, o apresentador e narador esportivo Kaio César,
publicou um esclarecimento em suas redes sociais pela atitude tomada ao pedir demissão, ao vivo, neste sábado, 16, após o término do programa Globo Esporte.
Na ocasião Kaio encerrou o programa em tom de desabafo, dizendo "O
Globo Esporte fica por aqui e eu também, pois estou pedindo demissão do
Sistema Verdes Mares. Não abro mão de respeito e da minha dignidade,
para trabalhar em lugar nenhum".
O fato repercutiu nacionalmente e as dúvidas ficavam no ar quanto aos
motivos do pedido de demissão do jornalista de 28 anos. O Sistema
Verdes Mares inclusive, publicou uma nota na qual dizia não saber o que
motivou o pedido de demissão de Kaio César.
Na manhã deste domingo, o próprio Kaio publicou um texto no qual
explica os motivos do pedido e não poupou críticas ao diretor do Sistema
Verdes Mares, Paulo César Norões. No texto ele chega a citar fatos que
atribuem, segundo Kaio, 'perseguição' do diretor com ele.
Confira abaixo o texto na íntegra escrito por Kaio César.
QUALIDADES E DEFEITOS
Pela repercussão do caso e número de mensagens que venho recebendo,
ao passo que agradeço todo o apoio, esclareço aqui meu motivos para
pedir demissão ao vivo do Sistema Verdes Mares.
.
Sobre qualidade e defeito, um dia me disseram que há cargos cujos
profissionais, para ocupá-los, precisam ter os dois, especialmente o
segundo. Uma espécie de código real e não oficial, situado nas camadas
baixas da honra e envolvido por conceitos tanto arrogantes quanto
ultrapassados: “diz-me teus defeitos que eu fabricarei tuas qualidades”.
Talvez seja tarde, mas hoje digo sob absoluta convicção que o que ouvi
não era um pensamento vão, mas realidade comum e incontestável.
Em quase onze anos de empresa – cheguei aos 17 de idade – cometi,
lógico, muitos erros. Todos, no entanto, no âmbito profissional, ainda
assim julgo ter passado bem, sem qualquer falta grave. Nunca um erro de
ordem ética, no sentido de diminuir algum colega enquanto pessoa, por
exemplo, ou assediá-lo moralmente. É só ir atrás e você vai ver que
mantive minha linha, com retidão. Jamais ofendi a honra pessoal muito
menos a família de alguém no meio de uma redação, outro exemplo.
Fizeram isso comigo. E fizeram mais.
Darei apenas um nome, uma vez que os outros, de cargos menos
elevados, cometeram falhas, acredito, mais por ter a proteção dele do
que por maldade, simplesmente. E quanto a esses outros, já tratei dos
problemas pessoalmente, então caso resolvido. Mas, quanto ao hoje
diretor Paulo César Norões, eu preciso não me calar e encarar qualquer
consequência e até retaliação. Me apunhalou por muito tempo.
Arrogante, ele nunca soube lidar com quem pensa diferente,
principalmente os que julga inferiores. E eu, por ter raízes, convicções
– políticas e esportivas – e personalidade extremamente opostas nunca
fui respeitosamente aceito por ele. Lembro-me que um dia, no meio de uma
reunião do esporte, quando era nosso editor-chefe, mandou-me “tomar no
cú” por ter discordado dele. Curioso é que pouco antes, quando eu ainda
estava na na TV Diário, outra emissora do SVM, ele havia tentado me
barrar da cobertura da Copa das Confederações sob a alegação de que eu
era “tímido demais”, nas palavras do diretor Roberto Moreira, diretor da
TV Diário.
Roberto Moreira, aliás, apesar de amigo pessoal do PC, sempre foi
muito correto comigo. Foi ele quem me abriu as portas dentro da empresa,
me defendeu e me deu grandes oportunidades. Até quando tomou alguma
atitude que me prejudicasse, procurou agir com decência e lealdade. Devo
a ele gratidão e respeito. Espero que seja sempre assim.
Pois bem, depois da Copa das Confederações, com a ida de Antero Neto
para o Rio de Janeiro, surgiu uma vaga na TV Verdes Mares. O próprio
Roberto Moreira me chamou e, por três vezes, insistiu para que eu fosse
conversar com PC a fim de ganhar uma oportunidade na principal emissora
do estado – a esta hora PC já tinha achado um substituto em Fábio
Pizzato, que passou a narrar os jogos. Eu relutei porque imaginava que
ele, Roberto, estivesse me testando. Só após o quarto pedido tomei
coragem de me dirigir ao PC, que disse não ter vaga. Ocorre que, quando
Roberto soube da resposta, imediatamente entrou em contato com o diretor
da TV Verdes Mares, Marcos Gomide e, poucos dias depois, eu estava
ocupando a tal da vaga, já existente.
O tempo foi passando e os movimentos estranhos continuaram. Outra vez
foi no Bom Dia Ceará, onde eu era o substituto do Marcos Montenegro.
Quando estavam preparando a saída do Marcos para o CETV2, veio a
informação de que outro profissional, então estagiário, ocuparia o
lugar. Curioso é que, poucos meses antes, a Lianne Quezado,
editora-chefe do Bom dia e uma das pessoas mais profissionais e corretas
que conheço, tinha me falado sobre muitos elogios feitos à minha
desenvoltura dentro do telejornal por uma equipe da Globo, que comumente
vai às afiliadas avaliar o padrão jornalístico. Não fiquei calado e
disse diretamente ao PC que aquela atitude era uma “sacanagem” comigo.
Foi aí que o diretor Marcos Gomide interferiu e me confirmou no bloco de
esportes do Bom Dia, dizendo, segundo me afirmou Fábio Pizzato, a
seguinte frase: “Kaio é um talento que a gente não está aproveitando”.
Mesmo pouco depois saindo da editoria de esportes para ser um dos
diretores do SVM, PC continuou interferindo nos assuntos do esporte
dentro do grupo. E um dos projetos desenvolvidos logo após ele assumir o
cargo que era do pai, Edilmar Norões - saudoso e de respeitosa memória -
foi o projeto dos “Craques da Verdinha”, sob coordenação de Antero Neto
e sob o rótulo da renovação. Para minha surpresa, mesmo tendo inclusive
entregado um projeto – até os jingles da equipe são com minha letra,
umas em parceria com Antero Neto - do qual muitas ideias foram
aproveitadas e já sendo narrador da Rádio Verdes Mares desde 2008,
fiquei inicialmente de fora. Só entrei depois da desistência de Bosco
Farias, ainda assim, só para constar, com um dos menores, se não o menor
salário da equipe. E tudo isso eu vinha denunciando.
Ainda em relação à rádio, num evento mais recente, durante a Copa da
Rússia, Antero Neto, meu amigo e conterrâneo, teve uma atitude digna.
Vendo que eu não estava narrando nenhum jogo do Brasil, me sugeriu
narrar o último da primeira fase, único até então garantido de acontecer
na capital russa, onde eu estava baseado. Para minha surpresa, ato
contínuo do Antero: “Mas o PC não deixa. Embora eu não concorde, ele
disse para eu narrar todos os jogos do Brasil e que eu sou o sucessor do
Gomes Farias.” Daí eu indaguei, só por indignação: por que narramos
juntos os jogos do Brasil na Copa América de 2011? E porque ele vem me
elogiando tanto no grupo em meio a tantos diretores? Dissimulação?
Fiquei sem resposta e continuei, com a força da gratidão, narrando os
outros jogos.
Tudo isso foi ocorrendo em combinação com outros acontecimentos, que
não posso reputá-los todos ao PC Norões, mas, por tudo isso que já
relatei, seria natural pelo menos desconfiar que alguns tenham
interferência dele.
Para me ater apenas ao que se refere à narração esportiva,
inicialmente me tiraram dos jogos do Premiere Futebol Clube, onde
narrei, se não me falha a memória, quatro jogos em três anos e depois de
muita briga, mesmo sendo o titular da afiliada da Globo no Ceará.
Depois, me tiraram da rádio, alegando, pasmem, que minha saída era para
que eu pudesse me dedicar aos jogos do PFC, sendo que depois voltei pro
rádio para tapar buracos e sem o salário que eu lá recebia. Por último,
fui perdendo espaço também nas transmissões da TV Verdes Mares. O
motivo? Tive que folgar obrigatoriamente dois domingos no mês. Apesar de
absurdo do ponto de vista da rotina jornalística - muito mais do
esporte, que trabalha essencialmente às quartas e domingos - tudo bem.
Se é uma norma da empresa em acordo com o Ministério do Trabalho, o
jeito é acatar. Mas, por que há contratos diferentes que não exigem
isso? Mais uma vez fiquei sem resposta.
Por último, deixei para relatar o mais grave, que foge sobremaneira
da esfera profissional. Em meio a tantos fatos que configuram
perseguição, certa vez PC Norões se dirigiu à mim e proferiu ofensas à
minha família que não as repito aqui porque tenho dois filhos, entre
eles uma enteada, e poderia expor pessoas que não tem nada a ver com a
história. Só adianto uma coisa, não tem nada a ver com traição da minha
mulher, como inventaram de ontem pra hoje.
E foi assim que pouco a pouco me escantearam, sem qualquer pudor ou
respeito por mim, um profissional que se dedica há tanto tempo à mesma
empresa, e que foi avaliado como sendo de “bom caráter” ao ser promovido
de uma emissora a outra dentro do SVM.
Sobre as imagens que ilustram esta postagem, são números do futebol
da TV Verdes Mares, especialmente dos primeiros meses do ano, quando
entramos no ar com maior frequência. Considerando todas as transmissões
das afiliadas da Globo no Brasil, a Verdes Mares foi a que mais cresceu
em 2018. E isso foi mostrado num evento da própria Globo, em São Paulo.
Motivo de orgulho!
Agora vejam e reparem nos meus números e tirem suas conclusões. Não
quero dizer, com isso, que sou melhor ou pior - não é essa minha
indignação. Quero apenas constatar que as pessoas aprovaram meu
trabalho, que foi construído ao longo de, ao todo, 15 temporadas da
minha vida. Hoje sou um narrador de rádio e TV que, aos 28 anos, tem 3
Copas do Mundo, 2 Copas América e 1 Copa das Confederações, currículo
raríssimo no Brasil para alguém da minha idade.
Recentemente, diante de todos esses problemas, cheguei a pedir minhas
contas ao Marcos Gomide, diretor da TV Verdes Mares. Ele me pediu
paciência e a única coisa que aconteceu foi aumentar o salário por um
lado e tirar as horas extras por outro. Ou seja, ficou na mesma.
Fora dos jogos do PFC, passei a não receber mais cachês – que, por
sinal, já avisaram que não serão mais pagos aos profissionais que
trabalharem neste ano; fora da rádio, meu salário foi reduzido em quase 3
mil reais, sem falar no corte das horas extras. Quanto ao desgaste
emocional, as pressões me deixaram no chão. Na Rússia, encarei uma crise
emocional tão dura que, por Deus e pelas pessoas que amo, reconsiderei
fazer o pior.
Apesar de tudo, preciso agradecer. Sou profundamente grato ao Sistema
Verdes Mares pelas oportunidades que tive, embora nos últimos anos, o
diretor citado tenha insistido em me tirar do páreo. Aproveito e pontuo
aqui minha gratidão à outra pessoa, o mestre Tom Barros, que sempre
esteve à minha disposição. Da mesma forma, faço saudações a todos os
colegas do SVM e de outras empresas que, de alguma forma tenham me
ajudado e que podem estar passando por algo parecido. A Mirela Forte,
minha esposa, por exemplo, foi demitida um mês depois de voltar de
licença maternidade, recebendo a notícia de que voltaria em breve.
Alguns meses depois, foi decidido que não iriam mais contratar cônjuges
de funcionários.
Disto isso, diante do paradoxo dos resultados que apresentei com meu
trabalho enquanto narrador esportivo – minha principal função e motivo
pelo qual me dedico ao jornalismo - e os problemas que enfrentei nos
bastidores durante esses anos, humilde e despretensiosamente chego a uma
conclusão: as qualidades necessárias para narrar no Sistema Verdes
Mares eu possuo, mas os defeitos ideais para me manter no cargo, estes
me faltam.
Sindjorce e Fenaj prestam solidariedade
Sindjorce
presente na porta da empresa. Na foto, da esquerda para a direita,
Evilazio Bezerra, diretor de ação sindical, Mirton Peixoto, diretor
executivo, Samira de Castro, presidente, Germana McGregor, diretora de
administração e finanças, e Rafael Mesquita, secretário-geral. Foto:
Tarcísio Aquino.
O Sindicato dos Jornalistas do Ceará (Sindjorce) e a Federação
Nacional dos Jornalistas (FENAJ) prestam total solidariedade. Logo após
tomar conhecimento da demissão de Kaio César, na tarde deste sábado,
diretores do sindicato foram até a porta da empresa prestar apoio ao
colega, além de conversar com outros trabalhadores, que confirmaram a
precarização, a pressão e o assédio enfrentados.
“A categoria precisa reagir a altura ao nível de precarização que as
empresas jornalísticas querem nos impor. Kaio, parabéns pela sua
atitude, que demonstra dignidade. Que outros se inspirem e que lutemos
todos juntos”, disse Samira de Castro, presidente do Sindjorce. A
dirigente, inclusive, tentou contato com o apresentador e informa que a
organização sindical coloca toda a sua estrutura, assim como assessoria
jurídica, à disposição do profissional.
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