sábado, 28 de maio de 2016

Só leis não funcionam contra estupros, é preciso mais educação, diz juíza

Os casos de estupros coletivos ocorridos no Piauí,no Ceará e agora no Rio de Janeiro são, segundo a juíza Adriana Ramos de Mello, apenas a ponta do iceberg frente a uma cultura arraigada no país que estimula a violência contra a mulher. Em média, uma mulher é estuprada no Brasil a cada quatro minutos, de acordo com dados do 8º Anuário Brasileiro de Segurança Pública.
Para a juíza, titular do 1º Juizado de Violência Doméstica contra a Mulher, no Rio, não basta apenas punir os agressores e não pensar em mecanismos para reverter este quadro. Ela aponta como principal medida a inclusão do estudo de gênero, direitos humanos e combate à discriminação nos currículos escolares. "Quando vejo que foram adolescentes que participaram do estupro coletivo no Piauí, penso que alguma coisa falhou nessa educação", afirma. "Estamos só cuidando de quem já morreu, vai morrer ou já sofreu a violência. E essa mulher que não foi agredida mas vai ser?", questiona.
UOL - Há silêncio em torno dos casos de estupro?
Adriana Ramos de Mello - Existe uma dificuldade por parte das vítimas de denunciar, de se identificarem como vítimas do estupro. E ainda há o medo e a vergonha de se exporem perante as autoridades e reviver aquela experiência. A violência sexual é uma das formas de violência mais graves. Envolve o sentimento de poder que o homem tem sobre a mulher. É cultural.
Podemos falar em uma cultura de estupro?
A cultura patriarcal, de desigualdade de poder nas relações entre homens e mulheres, incita a violência. Além da violência física, há um estímulo simbólico à violência muito forte, principalmente na imprensa e na publicidade. A erotização da mulher, com frequência colocada como se fosse um produto, por exemplo, é uma forma de incitar a violência.
Nos últimos dois anos ocorreram vários casos de estupros coletivos no país. Esses casos são comuns ou têm sido mais noticiados?
O estupro é um crime que tem uma subnotificação [ausência de notificação às autoridades] muito grande. É difícil dizer se estupros coletivos sempre existiram ou só não eram denunciados. Normalmente, estamos habituados a ver notícias sobre isso em outros países, como na Índia, em que casos assim são recorrentes. Nesse caso do Piauí talvez estejamos acompanhando uma mudança cultural ao ver a sociedade se posicionar, perceber isso como crime um grave, que também acontece no Brasil.
Há uma evolução na luta contra a violência contra a mulher?
Sempre tivemos punido no Código Penal o homicídio, que inclui homens e mulheres. Ao criar o conceito de feminicídio, você politiza, torna público algo que não era visível, que é o assassinato de mulheres apenas pelo fato de serem mulheres. E a morte de mulheres no Brasil tem uma peculiaridade. Enquanto os homens costumam morrer em decorrência da violência urbana, troca de tiros, tráfico etc., grande parte das nossas mulheres morrem no ambiente doméstico. A maioria delas quando decide romper com essa relação violenta -- o fim do relacionamento é o momento de maior vulnerabilidade. Muitas têm medo de se separar porque tem medo de morrer.

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